segunda-feira, 11 de janeiro de 2010

Anjos & Arcanjos - Devassidão Celestial

Enquanto todos dormem
Os anjos celebram a solidão
Em cálices de volúpia
Nos braços de um devasso
Severo Mestre, de barba branca

Ao som do cochilo dos mortais
Os anjos despem seus trajes
E bebem o licor nas taças cruéis
Que estão acima do bem e do mal
No berço da libertinagem angelical

E no sofrimento dos pequenos
Está o triunfo dos mais fortes
Segredo para os desavisados
Habitantes de um mundo tão escuro
Quando o sorriso de um Mestre jamais visto

Anjos e Arcanjos,
Triunfando misticamente
Em Seu cajado,
Cavalgando, despidos, pegajosos, sujos;
De carne e osso; Anjos Devassos

quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

O Herói por Trás da Glória

Me peguei, noite passada, com os pensamentos voltados para minhas glórias, meus feitos, os atos que enobreceram minha careira e fizeram de mim, um grande herói para muita das pessoas. Muitas das quais eu jamais vi, e se, o tivesse visto, não me agradaria um só centímetro de sua existência. Não entenda isso por orgulho de minha parte e sim por uma simples escolha da natureza, existe pessoas com quais não nos afinamos nunca, não interessa o fato de sermos artistas, cientistas, professores ou policiais. Valores pessoais estão acima dos civis. E o que me chamou atenção, após estas analises, foi como eu não sou este herói. Sim, o grande cientista renomado internacionalmente aqui, nunca teve uma noite com uma mulher e pior do que isso meus projetos me causam arrepios quando os termino. Verdade que fiz coisas boas para boa parte da população deste planeta, mas apenas meus projetos são heróicos. Eu sou o monstro que dentro do laboratório se esvai em lagrimas e precisa de substancias químicas para manter sua cabeça acordada durante as longas noites de estudo. Saberiam meus alunos que noite passada rodei com meu Mercedes por um bairro pobre atrás de cocaína? E pior ainda, que me humilhei a alguns meses no apartamento de um traficante por duas ou três gramas de cocaína? Sim, a substancia me prende num universo em que sou perfeito, longe dela a depressão me consome, o medo, a paranóia. Eis meus projetos, todos voltados para a humanidade. Soluções para a camada de ozônio? Para mim foi uma força que encontrei no mês passado de me manter afastado de mim mesmo. Ganhei quantos prêmios nos últimos cinco anos? Não saberia lhe dizer, mas com certeza, eles não tiveram a mesma importância que aquelas garrafas de whiskey importado que guardo com cuidado na escrivaninha do escritório.
O gênio se sente fraco toda noite, vocês não sabem. Estive em dois grandes eventos neste mês e brindei champanhe com companheiros antigos dos tempos de medicina e professores de universidades tão importantes quanto o governo americano. E deste encontro não tirei nada, absolutamente nada. Homens de terno, suando enquanto a noite avançava e as piadas sem graça (sempre as mesmas) para cima das belas mulheres que circulam por ali a procura de alguma transa. Uma certa vez tentei a sorte com uma dessas; não consegui. O destino sempre me sorri as avessas, com prêmios, projetos perfeitos, reconhecimento, nobreza, status; mas nunca com diversão, felicidade e companheirismo. Esqueço disso dentro do laboratório, com o nariz entupido de um pó branco e milagroso, experimentando milhares de combinações, escrevendo, analisando, tomando uma ou outra dose de whiskey, fumando cigarros, charutos, e depois no fim da noite, quando o sono não vem, eu dirijo sem direção e paro no caís de encontro com a solidão. Adormeço e acordo antes de alguém me ver, me retiro para casa e tento esquecer dos excessos, mas excesso de solidão não é tão fácil de esquecer, quem dirá esconder. Telefone me dá medo durante a madrugada, tenho ataques de pânico e quem sabe esteja com traços de esquizofrenia. Mas sou um gênio, preciso me manter firme, agradar as pessoas e ter uma fala rebuscada... mas acho que não consigo mais desenvolver um projeto tão bom quanto aqueles de um ou dois anos atrás. Verdade é que vem caindo meu nível, gradativamente. Faz cinco anos no mínimo que não me sinto realizado com um trabalho meu.
O herói por trás das glórias é tão silencioso quanto uma leve pluma caindo no oceano a noite; é de uma tristeza comum, viciado em um vicio comum e atormentado por fantasmas tão grandes quanto sua glória. Lembre-se : “quanto maior sua glória, maior seu fantasma”. Escrevi isto no teto sobre minha cama...

Um herói inglório, apenas...

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

O Fabuloso Mundo Circense dos Irmãos Grim e Schopendauber

Queria tomar um sorvete daquelas maquinas expressas, que no verão se encontra em qualquer esquina, mas era impossível devido a situação em que se encontrava. Uma vida de domador de leões não é fácil, ainda mais quando estes fogem para a cidade. Esqueci de lhes explicar a cena, Grim corre pela cidade atrás de um leão que escapou do seu circo, o Fabuloso Mundo Circense dos Irmãos Grim e Schopendauber. O leão que era de origem franco-espânica, não quis saber da tradição do espetáculo e se mandou assim que o carregador de amendoins chegou para repor o estoque do elefante, e agora corria pelas ruas com um homem atrás dele a gritar. O sol que brilhava no céu começou a ceder seu espaço para nuvens ameaçadoras e o frio que já se fazia bastante presente, passou a ser avassalador. Das gotículas de chuva que caiam, vieram flocos de neve e o coração de Grim ficou apertado. Mesmo com todo este frio ainda pensava no célebre sorvete expresso italiano. Nisso o leão teve a súbita idéia de virar a esquerda e para seu azar um caminhão vinha em disparada. Grim alucinado gritava e corria cada vez mais rápido, mas o leão era de boa inteligência e utilizando o gelo acumulado na pista, deslizou por baixo do caminhão.

Lá pelo final do dia, o leão se recostou numa arvore em um parque para seu descanso, Grim o perdeu de vista. A noite se anunciava silenciosa e o leão dormia debaixo de um pé de fruta congelada. A madrugada veio com os lobos que habitavam a madrugada e o leão indefeso se escondeu dentro de uma dessas maquinas de sorvete expresso italiano. O dia amanhece com Grim esbravejando para os lobos saírem de sua frente, o leão estava solto por aí, e quem sabe até teria sido devorado por aqueles mesmos lobos. Procurou pela tarde inteira, não encontrou sinal nenhum do animal. Seu desespero era tamanho quando encontrou uma maquina de sorvete expresso italiano, sozinha, esquecida em um canto do parque... correu para lá como se fosse a sua única razão de existir. Serviu uma porção carregada de sorvete de flocos e ainda colocou uma cobertura de morango, espremeu bem até sair o ultimo pingo da cobertura, pegou uma pazinha de plástico e se sentou de baixo da arvore e como se estivesse noutra dimensão se deliciou do seu adorável sorvete expresso sabor flocos com cobertura exagerada de morango. O sorvete gritou. Gritava apavorado a cada lambida que Grim proferia nele, o morango penetrava na sua pele rapidamente e a língua ajudava a derrete-lo rapidamente. Grim ficou assustado com o fato do sorvete gritar, nunca comera um assim antes, mas o sabor era incomparável e seguiu comendo até que percebeu que sua língua estava toda coberta por pelo, pelo de... LEÃO! Lembrou-se do seu felino que escapara no dia anterior e inundou de lágrimas o sorvete. Mas a descrença era tanta no seu futuro que seguiu comendo o sorvete, e se ouvia urros de um leão sendo devorado calmamente por uma língua peluda e o choro mais fervoroso que um criador de leões já havia derramado. Terminou o sorvete e apagou como quem acorda de um sonho, estava noutro tempo, noutro espaço sensorial e a vida lhe era fraca. Via seu leão correndo ao longe, maquinas de sorvete expresso italiano cuspindo pelos em casquinhas que se pareciam muito com dentes de leão e absorveu toda a nevasca para dentro de ti, num instante qualquer isolado dentro de uma maquina de sorvete numa esquina do tempo e da solidão.

O Fabuloso Mundo Circense dos Irmãos Grim e Schopendauber, nunca mais abriu as portas, mas sabe-se que ali, existiu uma das histórias mais nobres da história da humanidade.

sexta-feira, 4 de dezembro de 2009

Os Detonados


A gente sempre sonha em conquistar o mundo, sempre sonha em ser reconhecido, em ter muita grana, mas eu tenho pensado em me divertir um bocado. Já faz um tempo que venho me reunindo com amigos do colégio, do tempo em que ainda estudávamos, para aprender alguns acordes e também tocar algumas músicas. Pois bem, a gente tem conseguido isso, e está sendo empolgante. Olhamos os Beatles, sei lá, dá um frio na barriga esse lance todo, eles fizeram coisas impressionantes... com a mesma idade que nós, mudaram o mundo. A gente quer mudar o mundo também. É um desafio a cada ensaio, juntar um dó com um ré, uma letra com uma melodia, afinar um violão... essas coisas são gratificantes, pequenas e gratificantes.
Tenho sempre um grande susto quando ligo a guitarra, uma telecaster creme, no amplificador. O som se amplifica saca? É impressionante, isso é tão banal hoje em dia, mas eu sinto uma magia inexplicável por trás disso. Eu sempre me empolgo com as coisas, imagina então um sonho de anos..? Entrar num estúdio é assustador. Máquinas, equipamentos, amplificadores, guitarras elétricas, pratos, bateria, som, música, tudo alto, muito alto e (geralmente) harmoniosamente. Lindo! É excitante estar num estúdio, me sinto bem e animado. O som se amplifica. As músicas tomam vida própria, ficam ressoando pelas paredes do estúdio e o estúdio em si é algo mágico. Existe magia nessas coisas e eu não sei explicar muito bem porque fico tão emocionado com isso. Talvez eu seja apaixonado por fazer música, pela estética Rock’n’Roll disso tudo. É a primeira vez que uso a palavra “Rock’n’Roll” aqui, e parece que usei apenas esta neste texto. All right, that’s a trouble.
E mesmo que não tenha toda habilidade do mundo, muito menos a técnica, eu tento arduamente traduzir aquilo que sinto nas canções. A gente, porque não faço sozinho, tenta ser sincero, mas a empolgação é tanta que a gente vive mentindo nas letras. Talvez isso faça parte da arte de composição, ao menos no Rock. É emocionante dizer que está vivendo de esmolas na rua tocando gaita para burgueses no alto Leblon, sim, isso é emocionante numa canção! Mentimos por impulso, eu sei. Tanto nas músicas quanto em qualquer outro assunto relacionado a música, mas é impossível não mentir quando se esta tomando uma cerveja depois do ensaio num barzinho e passa alguém perguntando como vai a banda, “Ótimos, estamos preparando algumas coisas novas. Vamos gravar também, tocar por aí. Estamos ganhando grana” Isso tudo faz parte do Marketing da Mentira (do Rock’n’Roll). Me emociona. Tudo pode emocionar sabendo como ser dito, mas também vai depender da pessoa e da sua credibilidade com ela. Você tem de saber dominar as pessoas, seu publico, ainda mais se vai mostrar algo seu pra elas (isso não se relaciona a partes do corpo). A música é assim mesmo, mentiras agrupadas de maneiras divertidas, numa melodia simples e interessante, e vocês dançam.

terça-feira, 10 de novembro de 2009

De Lobatos e Tubarões

Lobato dormia enquanto o resto do dia e da vida corria impune sobre sua janela. Lá ele ficou durante o dia inteiro e sem mover um músculo, continuo por mais dois dias. Não sabia se dormia ou se havia morrido, quando então resolveu se levantar e para sua surpresa, não viu o reflexo tão habitual no espelho. Pensou em ir num hospital, pensou em ir na policia, no cabaré, na casa da sua tia, num bar encher a cara, numa escola, procurar emprego, mas não, dentre tantas alternativas preferiu a cama e voltou a dormir, sem nem entender o porque da decisão. Por mais dois dias ele passou deitado, não dormia, estava consciente, no entanto passou com os olhos fechados o tempo todo. Só abriu quando o sol do amanhecer do terceiro dia já lhe ofuscava a visão e novamente correu ao espelho, novamente tomou um susto ao não ver seu reflexo.
Lobato decide ir ao mar, se afogar e desaparecer de vez, sendo triturado e engolido por um tubarão ou quem sabe até piranhas. Desceu os quatro jogos de escada do seu prédio, abriu a porta e saiu de encontro ao mundo. Quando olhou na sua volta viu que não existia mar ali na sua frente. Havia apenas outro prédio, e outro, e outro e outro e uma casinha peculiar com uma cruz em cima. Certamente não era a praia. Perguntou para as pessoas, mas ninguém o escutava e sua paciência já estava se esgotando, achou melhor voltar para seu prédio. Subiu os mesmos quatro jogos de escadas e deitou.
Dormiu. Acordou, novamente três dias depois. Não sentia frio nem calor, não via sua imagem no espelho. Lobato não se sentia triste, nem alegre. Não tinha um pensamento a seguir, apenas desejava ir ao mar, se afogar e ser triturado por um tubarão. Não havia possibilidades, abriu sua janela, procurou o mar no horizonte, não o encontrava. O céu terminava atrás de um prédio cinzento e cheio de janelas.. e começava do lado de uma casinha peculiar com uma cruz em cima. Não entendia nada de prédios ou casinhas com cruzes em cima. Passou acordado até o anoitecer, e se espantou quando o céu azul se tornou escuro, bem aos poucos, não foi visível a mudança, mas foi gigantesca. Pensou que agora iria encontrar o mar, desceu correndo as escadas e atravessou a rua parou do outro lado e... não encontrou nenhum oceano com tubarões. Voltou devagar para seu quarto, tentando decifrar o que aquilo tudo significava.
Lobato dormiu novamente, só que dessa vez acordou logo no amanhecer. Ouviu o canto de um pássaro e entendeu que ele o mandava seguir até o mar, se afogar e ser devorado pelos dentes cruéis de um tubarão. Lobato sentou pensativo...



“O que são tubarões?”
, pensou antes de deitar e dormir novamente...

quarta-feira, 4 de novembro de 2009

Amor e morte ao sabor de Estricnina

Dois corpos rígidos abraçados; Rigor Mortis;
O músculo endurecido dos amantes;
Que já não sente dor;

Aquela tristeza não existe mais,
Foi-se aos poucos se esvaindo,
Junto com o ar, nesta morte agônica.

Pálidos corpos entregues a lua; Pallor Mortis;
Já não exibem a beleza de outrora,
Estão entregues a eternidade agora.

Caíram no inferno do esquecimento,
Juntos, assim como o desejado.
Este pacto mortal e cruel; romântico.

A pele fria, em contato com a noite, Algor Mortis.
Na sombria solidão das trevas,
Anoitecerá toda manhã para os dois.

E depois das juras, o pacto,
A fiel despedida, o beijo selado,
Com estricnina.

“Pretium doloris mortis”

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Um Dia Cinza


Abafado. Quente. Monótono. Devagar. Ranzinza. Triste. Apático. Reumático. Fraco. Poluído. Cansado. Arrastado. Silêncioso. Inerte. Ruídoso e quieto.

Assim eu defino o dia de hoje, resumindo, um saco. Não que não goste de dias assim, eles exibem uma poesia ímpar. Diferente de um dia ensolarado, bonito e encantador onde até o ar parece ter um gosto mais alegre. Dias cinzas nos remetem a nós mesmos, ao sono de uma vida inteira e assim, se cria a poesia.

Dias cinzas tem uma elegância própria, enquanto nos dias de sol a beleza fica por conta das cores exuberantes, nos dias cinzas você se atém as coisas pequenas, nos detalhes imperfeitos das coisas. O dia cinza é calculista, não deixa brechas para um sorriso, mas exibe a sinfonia de um.

Você nunca ouvirá alguém dizendo "nossa, que dia cinza lindo hoje!", mas certamente pensará, assim como muitos, que esse dia é ímpar, justamente pela falta de cor e mais tarde na intimidade da sua casa, a lembrança de um dia triste vai tomar conta do seu ser e por um segundo você vai desejar um dia destes denovo. Calmo. Quieto. Cinza.

Dias cinzas são intimistas. Se fecham para si mesmos, guardam o sol apenas para eles e pintam a cidade de cinza. São admiradores de uma beleza morta e fria.

Quando uma fina garoa acompanha o tom cinza de um dia a obra esta completa! Se pudessem, as gotas finas que caem das nuvens, seriam de sangue e pingariam em nossos guarda-chuva da maneira mais melancólica possivel. Um lindo dia cinza e triste.

Hoje, terça-feira, até os ônibus estão silenciosos lá embaixo, os passaros também não estão cantando... todos respeitando a realeza de um dia cinza.